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Rui Mendes - Contra mim falo...
há 356 semanas

Contra mim falo...

O título desta declaração tem uma razão de ser. Não deixa de ser bonito assumir culpas passadas, embora isso, na verdade, não sirva para resolver qualquer problema. Mas, apesar de tudo, talvez não deixe de servir de exemplo para quem vier a seguir.

Passo a explicar. O 25 de Abril de 1974 foi o restituir da dignidade a um país que estava doente e amordaçado por 48 anos de ditadura e privação de liberdades. No campo do Teatro e das Artes em geral, como em todas as atividades, de resto, foi a explosão de alegria que permitiu que muita coisa acontecesse que até aí estava proibida. Puderam escolher-se livremente as obras a representar, os filmes a realizar, os livros a editar, a poesia veio para as ruas, como alguém na altura disse. Todos, ou quase todos, nos deixámos embriagar com a possibilidade de falar, criar e produzir o que até aí não era possível e nos locais que estavam interditos. E foi uma época riquíssima de entusiasmo e criatividade. Mas, como todos sabemos, o tempo ou algo mais, entretanto encarregou-se de ir "murchando a festa, pá", como diz a canção do Chico. Não totalmente, claro, mas de forma preocupante...

E chegou a altura de explicar porque é que muitos de nós podem hoje reconhecer que a grande parte da culpa foi nossa. É aqui que entra o CONTRA MIM FALO... Com o tempo começou a vir ao de cima o que entretanto, a par da maravilhosa aventura da criação, tinha ficado por fazer: o estabelecer e regulamentar as condições justas de trabalho nas várias profissões ligadas às actividades artísticas. Alguns, verdade se diga, ainda tentaram, mas não conseguiram muitos resultados, em grande parte por falta de apoio das massas que continuavam embriagadas com a criatividade, sem pensar que nos estávamos todos a esquecer de uma coisa fundamental: as regras profissionais que podem proporcionar as bases para o regular desempenho das várias actividades ligadas à criação. No fundo, a dignificação do nosso trabalho de forma justa e indispensável.

Amigos e companheiros de trabalho: congratulemo-nos e celebremos agora a união dos nossos sindicatos neste CENA-STE, e procuremos dar-lhe a força de que ele necessita para conseguir aquilo que se propõe realizar. Não se esqueçam nunca de que O SINDICATO SOMOS NÓS, e que sem nós ele não pode ter a força que, por vezes, somos levados a exigir-lhe.

Vejam lá se evitam que, daqui a alguns anos, venham a dizer com amargura: "CONTRA MIM FALO..."  A resposta está nas nossas mãos. Saúdo-vos com muita amizade.

 

Rui Mendes, actor e encenador - Mandatário da Lista A