É preciso dar resposta aos problemas concretos que ostrabalhadores estão a sentir.
28 Janeiro de 2021
No sábado 30 de janeiro, porque a luta continua, mesmo não conseguindo sair à rua, apelamos a que se juntem a este protesto pelo futuro da Cultura.
#cenaste #cena_ste
Apesar dos avisos sucessivos dos especialistas de saúde de que com o aproximar do Inverno chegariam novas dificuldades e limitações impostas pela pandemia, o Governo apostou quase tudo num regresso simplista à normalidade. As insuficientes medidas tomadas até à data, meramente paliativas, estão a deixar cair num poço sem fundo grande parte dos trabalhadores em Portugal em que se incluem os profissionais do sector da Cultura.
As iniciativas de apoio do Ministério da Cultura revelam o entendimento político que este executivo tem do sector e explicam o parco Orçamento de Estado para a Cultura que deveria ser, para a sobrevivência do sector, sem subterfúgios e truques contabilísticos, pelo menos 4 vezes superior aos valores atribuídos para 2020. Desde logo a primeira, o TV-Fest, que até se poderia ter mantido como uma normal iniciativa do Serviço Público de Televisão em vez de ser apresentada como a grande iniciativa do Ministério da Cultura, de que cujo o montante anunciado se desconhece o destino; a atribuição de um milhão e setecentos mil euros para a Linha de Apoio de Emergência ao Sector das Artes (em mais de 1000 candidaturas 636 foram considerados elegíveis mas apenas 311 projectos foram apoiados, tendo-se verificado um incompreensível atraso na atribuição de alguns apoios que só recentemente chegaram aos seus destinatários); as linhas de apoio de emergência, PEES Linha de apoio social adicional aos artistas (com o objectivo de compensar os insuficientes apoios aos trabalhadores do sector com vínculos precários, pretende chegar a 18.000 trabalhadores num universo de pelo menos 130.000 e que só pode requerer quem já se tinha candidatado nos apoios lançados em Abril e Maio descontando o valor recebido nessa altura); a Linha de apoio às entidades artísticas profissionais (para a retoma) e a Linha de apoio à adaptação dos espaços às medidas decorrentes da COVID-19, limitadas na sua aplicação e novamente com valores muito abaixo do necessário ou até do realista ; o reforço do orçamento do ICA; a Linha de financiamento à programação cultural em rede.
Perante as várias medidas lançadas pelo Ministério da Cultura, que ocuparam tanto espaço mediático, seria de esperar que o sector respirasse um pouco melhor no final do Verão mas definitivamente não é o que está a acontecer. Na maioria dos casos as medidas não tiveram qualquer expressão ou quando chegaram, chegaram tardiamente e de forma insuficiente. Os valores anunciados com pompa e circunstância na prática não chegam à maioria dos trabalhadores da área e os relatos dramáticos de vidas bloqueadas, muitas em estado de insolvência sucedem-se.
Revisão do Modelo de Apoio às Artes
Para aquela que é uma reivindicação antiga do sector foram anunciadas um conjunto de alterações aparentemente relevantes mas muito pouco desenvolvidas o que deixa muitas preocupações na sua
aplicação.
Para que uma revisão do Modelo de apoio às Artes resulte é fundamental que Orçamento de Estado cresça de forma substancial de forma a assegurar que, finalmente, não fiquem estruturas elegíveis de
fora e se cumpra o pleno emprego com direitos e protecção efectiva dos trabalhadores do sector.
Um estatuto que esconde a falta de aplicação da lei geral do Trabalho
Após a terceira reunião do grupo de trabalho para o desenvolvimento do chamado "Estatuto para o Trabalhador da Cultura"; constatamos, mais uma vez, perante o esboço de intenções mal preparadas e pouco claras que o Governo tem imensas dificuldades em compreender o sector. Nesta reunião foi apresentado um esboço de Estatuto. Neste são elencadas, de forma simplista, algumas linhas copiadas directamente do código de trabalho e da Constituição da República. Poderia até parecer que o Governo teria percebido que se fizesse cumprir a lei muitos dos problemas que temos hoje simplesmente não existiriam. Mas ao avançar no documento percebemos pelos itens seguintes que não é o caso. Aparece, mais uma vez, de forma simplista, uma proposta que pretende premiar entidades que cumpram quotas de contratos sem termo. Afinal a intenção é premiar aqueles que prevaricarem dentro de certos limites? Até quando vamos continuar com máscaras para a ilegalidade e a precariedade?
O terceiro ponto do documento Regime contributivo e de Protecção Social, razão fundamental para a existência deste grupo grupo de trabalho que inclui, além do Ministério da Cultura, o Ministério do Trabalho e da Solidariedade Social e o Ministério das Finanças acabou por ser apresentado como um ponto ainda a discutir durante o mês de Outubro. Adia-se mais uma vez a discussão de fundo: como garantir uma carreira contributiva que proteja os profissionais do sector em vez de os endividar, como garantir os seus direitos (o acesso à baixa e à protecção no desemprego) e como recuperar os trabalhadores para o sistema, muitos condenados à informalidade e ao endividamento por conta de décadas de um sistema que tem como primeira opção a precariedade.
O questionário aos trabalhadores, fundamental para a implementação de medidas de fundo e de emergência sérias para o sector e que já deveria ter sido lançado continua por terminar longe dos olhares e do escrutínio das entidades representativas do sector que conhecem de facto a realidade do trabalho e dos profissionais da Cultura em Portugal. É a estas entidades que cabe validar esta ferramenta urgente para o mapeamento do sector e permitir que as soluções legislativas sejam consequentes.
Tendo em conta que o Ministério da Cultura diz estar a trabalhar em nova legislação para o sector desde Dezembro de 2019, seria de esperar muito mais deste documento.
Esta ideia de Estatuto, importada à força de outras realidades e com resultados duvidosos, parece ser uma cápsula de precariedade disfarçada, não propõe medidas efectivas e não tem nenhuma intenção de melhorar a legislação de forma consequente para os trabalhadores da Cultura em Portugal.
O CENA-STE lembra as palavras da Ministra do Trabalho e da Solidariedade Social na primeira reunião do grupo do chamado "Estatuto": é fundamental assegurar aos trabalhadores do sector da música, do audiovisual e dos espectáculos o acesso pleno a uma carreira contributiva, só assim será possível garantir protecção e direitos sociais, evitando que se repita a catástrofe que vivemos nestes tempos.
Lembramos também as palavras da Ministra Ana Mendes Godinho sobre as convenções colectivas como solução para o futuro, garantia de uma base mínima negocial para a defesa dos interesses individuais e colectivos dos trabalhadores, elemento facilitador da negociação entre os representantes dos trabalhadores (o sindicato) e os patrões.
Situação do audiovisual
No sector audiovisual, à crise instalada e ao crónico sub-financiamento da produção nacional junta-se a perspectiva de diminuição das fontes de financiamento do ICA, pela perda de receitas em favor de novos protagonistas internacionais. Caso se perca a oportunidade de alargar as suas fontes de financiamento, taxando da mesma forma os novos actores globais, e enquanto a dotação do ICA não passe a constar especificamente no Orçamento de Estado com o necessário reforço de verbas, todo o ecossistema audiovisual da produção à difusão - estará numa situação calamitosa. Acresce o cenário de economia paralela que caracteriza o sector, em que os enredos de ilegalidade e de atropelo das mais elementares condições laborais não são ficção.
O governo parece esperar que o tempo passe e a crise desapareça
O Governo, através dos seus ministérios da Cultura, do Trabalho e da Solidariedade Social, das Finanças tem ignorado sucessivamente grande parte das propostas, dos avisos, dos pedidos feitos pelo CENA-STE e por tantas outras estruturas que se uniram nos apelos, nos manifestos sucessivos, na rua e até na acção solidária substituindo um Executivo que falhou e continua a falhar.
Terceiro Inquérito CENA-STE em tempos de Pandemia
Os resultados do mais recente inquérito feito pelo CENA-STE em pleno período deretoma revelam bem a situação dramática de um dos sectores mais expostos às consequências da pandemia.
O inquérito diz-nos que 54% dos trabalhadores inquiridos têm mais de 15 anos de experiência, apenas 12% têm contratos sem termo. Este facto demonstra claramente o nível de precariedade do sector. Como forma de colmatar uma actividade ocasional e imprevisível, 70% dos trabalhadores têm uma segunda actividade, trabalhando muito para lá das 8 horas diárias desejáveis com óbvias consequência para a sua vida pessoal e familiar.
Confirma-se que mais de 80% da actividade prevista foi cancelada ou adiada e, ao contrário do que tem sido dito pelo governo, apenas 7% diz ter visto as suas actividades profissionais reagendadas com data concreta.
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